
Dra Karen Scavacini, mestre em Saúde Mental Pública pelo Karolinska Institutet, doutora em psicologia pela USP e fundadora do Instituto Vita Alere, fala sobre os perigos da adicção para a saúde mental
A dependência química é uma doença complexa e que acomete, em média, 6% da população brasileira (dados de 2021 apresentados pela OMS) e que afeta não apenas a pessoa usuária, mas todos os que estão ao seu redor. Muitos estudos conduzidos ao longo de universidades renomadas em todo o mundo comprovaram que a adicção traz sérios problemas à saúde mental dos usuários e de amigos e familiares. Dra Karen Scavacini, fundadora do Instituto Vita Alere, fala sobre o tema: “A dependência química, seja por substância lícitas ou ilícitas, altera a química cerebral, comprometendo funções cognitivas e emocionais, o que pode resultar em comportamentos agressivos e impulsivos. Além disso, a busca e o desejo pela substância podem levar ao isolamento social e ao comprometimento de responsabilidades pessoais e profissionais”.
Os efeitos – e os problemas – causados pela adicção refletem também na vida de familiares e pessoas próximas: “É bastante comum que familiares enfrentem uma séria instabilidade emocional e que muitas vezes resultam em diagnósticos como ansiedade, depressão e estresse. Muito dessa instabilidade e fragilidade da saúde mental vem da preocupação constante com o comportamento do dependente. A dependência química pode trazer violência e irritabilidade e a família se sente, num dito popular, ‘pisando em ovos’ para lidar com o dependente que, numa comparação de fácil explicação, é uma bomba relógio prestes a explodir”, diz a doutora.
Além do medo e da preocupação causados pelo comportamento dos dependentes, a preocupação financeira pode surgir – e aqui surge também uma nova categoria de vício: a dos jogos, hoje especialmente os eletrônicos. “O uso de substâncias lícitas ou ilícitas gera a preocupação financeira pois o dependente faz de tudo para conseguir acesso ao que o viciou. Esse círculo vicioso da adicção faz com que a pessoa não apenas gaste excessivamente, mas perca seu emprego por conta das consequências do vício. E de alguns anos para cá, outro tipo de dependência abalou a estrutura financeira – e mental – das famílias: os jogos eletrônicos, como o do Tigrinho. Um jogo que vicia ao alcance dos aparelhos celulares causam estragos financeiros e mentais tão sérios quanto a adicção a substâncias”, completa Karen.
E não são apenas mudanças comportamentais e financeiras que colocam em risco a saúde física e mental dos dependentes e familiares; a dependência pode causar alterações na dinâmica familiar que afetam inclusive crianças. “É bastante comum observar uma troca na dinâmica familiar de um dependente: crianças assumindo o papel de adultos e cuidando de seus irmãos menores no caso de pais dependentes. Essas crianças perdem boa parte de sua infância e essa inversão de papeis resulta em problemas emocionais e comportamentais, algo que pede atenção e cuidado”, explica a psicóloga.
A busca por ajuda profissional é fundamental e não apenas para o dependente que, sim, pede intervenções médicas. Mas não basta apenas a intervenção médica; todos os membros envolvidos precisam de suporte psicológico e social, sendo o processo terapêutico fundamental para a recuperação do dependente e restauração do núcleo familiar. E aqui devemos nos atentar para outro aspecto que vem de fora: o preconceito que ainda existe com relação à adicção.
“A dependência é uma doença, como tantas outras que existem. Mas o preconceito que envolve tanto o dependente quanto seus familiares por parte da sociedade é mais um fator de adoecimento emocional. É preciso que a sociedade faça o seu papel em acolher os envolvidos entendendo que a dependência química é uma doença e não ‘falta de vergonha na cara’, ‘falta de caráter’ e outros adjetivos pejorativos que se usam por aí. O acolhimento de todos os envolvidos é parte fundamental para o sucesso do tratamento, tanto físico quanto mental. Que façamos, portanto, a nossa parte”, finaliza Karen.
Sobre a Dra Karen Scavacini:
Dra Karen Scavacini é idealizadora, cofundadora, coordenadora e responsável técnica do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio. Formada em psicologia, Karen é doutora em “Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano” pela USP e mestre em “Saúde Pública na área de Promoção de Saúde Mental e Prevenção ao Suicídio” pelo Karolinska Institutet, localizado na Suécia.
É representante do Brasil no IASP (International Association for Suicide Prevention), membro da American Association for Suicide Prevention, nos Estados Unidos; do LIFE (Living is for Everyone), na Austrália; do Global Mental health Action Network (GMHAN), e do Global Psychology Network, além de autora de um livro que auxilia pais e educadores a conversarem sobre suicídio, “E agora? – Um livro para crianças lidando com o luto por suicídio”. Além disso, é responsável pelo Centro de Inovação e Pesquisa em Saúde Mental, Tecnologia e Suicidologia do Instituto Vita Alere.
Palestrante TEDX, Dra Karen participou de eventos nacionais e internacionais falando sobre a importância de se falar sobre saúde mental, uso digital, prevenção e posvenção do suicídio. Entre os eventos participantes estão o Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sirio Libanês, o IPQ USP – Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e a Faculdade Getúlio Vargas (FGV).
Sobre o Instituto Vita Alere:
O Instituto Vita Alere tem por visão uma sociedade mais aberta e atenta à saúde mental dos indivíduos, organizações e da própria sociedade, onde a promoção da saúde mental seja um objetivo contínuo, reduzindo preconceitos, criando consciência pública, falando abertamente, valorizando a vida, promovendo formas mais saudáveis de se relacionar e enfrentar os sofrimentos existenciais, facilitando a recuperação e tratamento.
Pioneiro no Brasil em sua área, foi fundado em 2013 com a missão de promover a saúde mental do indivíduo, organizações, instituições e sociedade, com o foco na promoção de saúde mental, prevenção e posvenção do suicídio e autolesão, sendo referência na área através do desenvolvimento de projetos, tratamento especializado, pesquisa e atividades de educação, suporte e apoio, com inovação, dedicação, respeito e cuidado.
Texto: Tatiana Fanti para Prima Donna – Comunicação e Empreendedorismo
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