Imprimir órgãos como pulmão, fígado e até coração, por meio de impressoras 3D é uma realidade muito próxima e deve se tornar bem comum na próxima década. É o que garante o médico e empreendedor Gabriel Liguori, Forbes Under 30 e fundador da TissueLabs, uma startup brasileira que desenvolve equipamentos e materiais para a confecção de partes do corpo humano por meio da chamada “engenharia de tecidos”, área do conhecimento que utiliza células-tronco para regenerar e fabricar órgãos.
Resultado de um dos projetos desenvolvidos no doutorado de Liguori, que criou, em 2018, um gel capaz de agrupar células e dar comandos para que elas se desenvolvam em um tecido. “Quando falamos de fabricação de tecidos, não é muito diferente da construção de uma casa”, diz. “Para levantar a construção, você vai precisar de tijolos – as peças essenciais, que são as células correspondentes do órgão – e de cimento, que é a matriz extracelular, um conjunto de proteínas que unem essas células”, explica Liguori.
Por meio de R$ 2,1 milhões de financiamento de instituições públicas de pesquisa, como a PIPE-FAPESP (Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas), e de R$ 1,5 milhão de investimento privado, Liguori, junto ao engenheiro Emerson Moretto, conseguiu colocar o projeto da TissueLabs de pé em 2019 e, comercialmente operante, em 2020. Hoje, a companhia tem operação na incubadora Cietec, em São Paulo, onde fica a produção dos materiais e equipamentos, e na comuna de Manno, no cantão de Tessino, na Suíça, local onde fica o departamento de relacionamento com clientes e parceria de pesquisas.
Com um portfólio de mais de 50 produtos focados na fabricação de órgãos, divididos entre bioimpressoras 3D e as chamadas “biotintas”, que são usadas para impressão de tecidos e conseguem replicar exatamente as centenas e milhares de proteínas que existem na natureza, ao contrário da maioria das empresas do setor que utilizam materiais genéricos, como colágeno puro ou gelatina”, afirma o CEO. Hoje, a healthtech possui 15 tipos diferentes de tecidos – que servem para a impressão de órgãos e partes do sistema cardiovascular, respiratório e digestivo, por exemplo – e cada um deles possui de duas a três variações de gel.
Apesar de ter as tecnologias patenteadas, isso não impediu a companhia de vender seus produtos para mais de 50 laboratórios em 14 países, totalizando quase 300 pesquisadores.
Com cerca de 15 funcionários no Brasil e na Suíça, a TissueLabs tem a perspectiva de faturar R$2 milhões em 2021, o que representa um crescimento quatro vezes maior do que o registrado no último ano.
O grande objetivo da TissueLabs se espelha na história do seu fundador. Com poucos dias de vida, Liguori foi diagnosticado com cardiopatia congênita, uma condição que impede o coração de bombear o sangue corretamente. Aos dois anos, foi operado no Incor (Instituto do Coração) e sempre teve em mente que precisava ajudar outras crianças com a mesma complicação.
A princípio, seu desejo era ser cirurgião cardíaco, mas a paixão pela pesquisa e a engenharia de tecidos mudou o seu caminho. “Quando voltei da Holanda, tive a oportunidade de começar um laboratório de pesquisa e fiquei por dois anos focado em construir um coração bioartificial para transplante”, diz. Foi a partir desse trabalho que o primeiro gel para o desenvolvimento de tecidos por impressão foi criado, abrindo portas, pelo menos em um primeiro momento, para aplicações mais palpáveis na área cardiovascular.
Segundo ele, crianças com cardiopatia, na maioria das vezes, precisam realizar uma correção nas válvulas do coração. Com o crescimento, os dispositivos implantados precisam ser trocados e, portanto, novas cirurgias são necessárias. Utilizando uma válvula criada em laboratório com material biológico, por exemplo, o tecido cresceria junto com a criança, sem necessidade de novas intervenções.
Para Liguori, esse tipo de tecido, inclusive, está mais próximo de ser utilizado na prática, de maneira clínica. “Antes mesmo de um coração completo ser fabricado, nós vamos colocar no mercado produtos que vão endereçar outras necessidades, como válvulas cardíacas, vasos sanguíneos e artérias”, afirma. Nesse processo de longo prazo, mirando o órgão por completo, segundo o CEO, há muito espaço para desenvolvimento de tecnologia e a realização de pesquisas.
*Com informações da Forbes
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