Ficar dias sem comer ou comer de forma compulsiva e sentir culpa: entenda sobre a anorexia e bulimia - FRONT SAÚDE
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Ficar dias sem comer ou comer de forma compulsiva e sentir culpa: entenda sobre a anorexia e bulimia

A busca pela beleza de um padrão inalcançável pode fazer com que uma pessoa deixe de se alimentar de maneira saudável, passe a adiar sua fome por horas e dias ou até mesmo se arrependa de forma exagerada por ter comido algo. Comportamentos como estes podem ser praticados por quem tem doenças como a anorexia e bulimia, classificadas como transtornos alimentares.

Segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria (SBP), estima-se que, no mundo, mais de 70 milhões de pessoas sejam afetadas por um transtorno alimentar, incluindo anorexia, bulimia, transtorno de compulsão alimentar e outros. Estes tipos de transtornos têm a maior taxa de mortalidade de qualquer doença psiquiátrica. “Transtornos alimentares são quadros psiquiátricos caracterizados por profundas alterações no comportamento alimentar e disfunções no controle de peso e forma corporal que levam a sérios prejuízos clínicos, psicológicos e de convívio social”, explica a nutricionista especialista em comportamento alimentar Priscila Reis.

De acordo com o Ministério da Saúde, mulheres são as mais acometidas por esses distúrbios. A anorexia apresenta maior incidência entre 12 a 17 anos, já a bulimia se mostra mais presente no começo da vida adulta.

O psiquiatra Rodrigo D’Oliveira esclarece que, em ambos os transtornos “existe a preocupação excessiva com o peso e a autoimagem corporal, culminando com alterações no padrão alimentar natural, dando origem a sofrimento intenso, alterações no corpo como perda de peso excessiva ou tentativas de não ganhar peso ao se alimentar”, afirma.

Diferenças entre anorexia e bulimia

O médico destaca que em um quadro de anorexia, há restrição da ingestão de alimentos, medo intenso de ganhar peso, levando ao índice de massa corporal significativamente inferior ao normal. Em relação a bulimia, não há o baixo peso com a restrição alimentar, mas há compulsão alimentar seguida de culpa, culminando em mecanismos para amenizar e compensar essa compulsão.

Sintomas

Rodrigo comenta os principais sintomas desses transtornos:

Anorexia

Comer menos ainda que sinta fome, levando a um peso corporal baixo;

Medo intenso de ganhar peso ou engordar;

Ausência da percepção da gravidade que seu peso baixo ocasiona;

Episódios de compulsão e purgação como induzir vômitos ou uso de diuréticos ou laxantes.

Bulimia

Episódios recorrentes de compulsão alimentar; comer uma quantidade de alimentos maior que a maioria dos indivíduos comeriam na mesma ocasião, com sensação de não ter controle durante o episódio;

Após a compulsão, há a culpa e tristeza por ter comido exageradamente, gerando os comportamentos de impedir o ganho de peso;

Vômito auto-induzido;

Uso indevido de laxantes, diuréticos, medicamentos, exercícios em excesso ou o jejum.

Causas e diagnóstico

O especialista cita sobre os principais fatores que podem causar a anorexia e a bulimia. “Existem fatores biológicos que podem contribuir como a alteração dos níveis de dopamina e serotonina em locais específicos do cérebro. Fatores sociais como a indução da sociedade na ênfase da magreza e corpo dito como ‘ideal’. Fatores psicológicos como a fase da vida em que a pessoa esteja vivendo. Algumas vezes, há maior preocupação em relação à ser aceito pelo meio em que convive e por dificuldades ou demandas emocionais que a pessoa comprometida esteja vivendo naquele momento”, pontua.

Além disso, o médico revela que o diagnóstico pode ser feito por meio de avaliação com profissional que atue na área e consulta com o paciente e/ou familiares. “Deve-se identificar outros transtornos que também possam estar presentes e gerem agravamento dos sintomas como Transtorno Depressivo Maior, hipotireoidismo ou hipertireoidismo, desnutrição e outros”.

Tratamento

Rodrigo comenta ainda que, em alguns casos de anorexia pode haver necessidade de internação hospitalar. “Em ambos os transtornos, o tratamento é feito através de avaliações e consultas regulares, grupos e atividades. É necessário o manejo e abordagem multidisciplinar com psicólogo, médico, nutricionista entre outros profissionais. A terapia cognitivo comportamental é eficaz, a afim de reestruturar o funcionamento emocional relacionado à alimentação”, enfatiza.

Ele lembra que pode ser feito o tratamento medicamentoso e que há necessidade de saber se há outras doenças para que também sejam tratadas. “Algumas medicações podem ser usadas para ajudar no controle dos sintomas, porém ainda há muitos estudos a serem feitos para tratamentos mais eficazes. Devem ser tratadas outras doenças se presentes, como o transtorno depressivo ou a desnutrição. Uma abordagem eficaz é o investimento em saúde física e mental desprovida de padronização de corpos ou necessidade de ter uma imagem corporal idealizada para ser aceito na sociedade”.
E destaca que “todo o tratamento é individualizado e no caso dos transtornos alimentares, precisa ser multidisciplinar”, ressalta o especialista.

Planejamento Alimentar

De acordo com a nutricionista Priscila Reis, o planejamento alimentar de um paciente com transtorno alimentar depende da fase que ele se encontra. “Um paciente em crise, estágio avançado de anorexia por exemplo, devemos priorizar que ele se alimente, utilizamos suplementação para retirar o paciente do quadro de desnutrição”.

Segundo a especialista, o caminho para o processo de alimentação de um transtorno alimentar deve acontecer de forma progressiva, e isso inclui o não uso de alguns termos para evitar gatilhos para o paciente. “Na bulimia, a conduta é introduzir de forma gradual uma rotina de alimentação saudável com todos os tipos de alimentos como proteínas, carboidratos, fibras, sempre orientando sobre observações sobre grau de fome e saciedade, para que nenhuma refeição se torno gatilho para um episódio purgativo. Por isso a importância de não falarmos com esse paciente sobre calorias, peso e nomenclaturas como ‘isso engorda’, pois podemos desencadear um episódio que pode agravar ainda mais o quadro”.

Acompanhamento com especialistas

Priscila destaca a importância do acompanhamento com um especialista em relação a anorexia e bulimia. “A consulta com nutricionista em um tratamento de transtornos alimentares é chamada de terapia nutricional em que dependendo da gravidade do caso, os encontros são semanais ou quinzenais, visando sempre a melhora da relação do paciente com a comida”.

Ela pontua o papel do nutricionista no tratamento de um transtorno alimentar para que o paciente com o transtorno possa ter uma rotina saudável. “É mudar a relação da pessoa com a comida através de estratégias não prescritivas. À princípio, sem dietas ou restrições alimentares, fazendo com que aquele paciente volte a comer de forma tranquila, sem medo ou punição. Técnicas como diário alimentar, prática de mindfuleating também podem fazer parte do tratamento”.

A psicóloga Ana Cláudia Machado esclarece que a psicoeducação é o processo de reconhecimento e adesão ao tratamento diante do diagnóstico em questão. “O psicólogo irá ensinar o paciente a entender o que é considerado uma crise compulsiva, os sintomas do seu diagnóstico, seja bulimia ou anorexia, e em quais momentos a pessoa está mais propensa a sofrer um episódio”.

Segundo Ana, no momento do episódio, é necessário que o paciente tenha crítica sobre o que está ocorrendo para manejar melhor a situação, e “entender os gatilhos e as consequências emocionais do processo. Reiterar sempre a necessidade imprescindível do tratamento medicamentoso, para que não haja desistência. Mas, acima de tudo, oferecer um ambiente seguro e suporte emocional para a pessoa trazer suas dificuldades e vulnerabilidades no processo”.